Pesquisas feitas com mulheres em Altamira (PA), um dos municípios mais impactados pela usina hidrelétrica de Belo Monte, detectaram um aumento de casos de sífilis gestacional devido ao avanço do empreendimento, com explosão migratória, reassentamentos e rearranjo da lógica da cidade. Os dados são de um estudo apresentado na 76ª reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) realizada na última semana em Belém (PA), sendo encerrado no dia 13 de julho, no campus da UFPA (Universidade Federal do Pará). O estudo concluiu que, entre 2008 e 2019, foram registrados 499 casos de sífilis na gestação de mulheres da cidade. Os casos foram subindo ao longo dos anos e seguem uma proporção bem maior do que os indicadores nacionais da doença.
Usina hidrelétrica de Belo Monte
Um dos estudos feitos com mulheres de Altamira foi apresentado por Luisa Caricio Martins, do Núcleo de Medicina Tropical da UFPA. Os dados foram coletados por Amanda Duarte, professora da faculdade de Medicina da universidade em Altamira.
Sífilis é uma infecção sexualmente transmissível. Em gestantes, pode ser transmitida de mãe para filho por meio da placenta.
As pesquisadoras levantaram dados de 2008 a 2019. Uma primeira licença para Belo Monte foi concedida pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) em 2010. As obras tiveram um início efetivo em 2011. Em 2019, todas as 24 unidades geradoras da usina passaram a funcionar.
Nos dois anos que antecedem a construção de alojamentos para trabalhadores, 2008 e 2009, foram registrados menos de dez casos por ano de sífilis gestacional. Em 2010, já foram mais de 30. Em 2018, quase 70. E, em 2019, 50.
Cidade de Altamira
Ao todo, entre 2008 e 2019, foram registrados 499 casos de sífilis na gestação entre mulheres em Altamira. Os casos foram subindo ao longo dos anos, numa proporção bem superior aos indicadores nacionais da doença. Quase 92% dos casos se deram no espaço urbano.
A maior taxa de detecção da sífilis se deu entre gestantes no terceiro trimestre, com a constatação da doença na hora do parto. Houve um espalhamento da doença, com incidência em 49 bairros e RUCs (reassentamentos urbanos coletivos).
“O que se viu foi uma descentralização dos casos para a periferia da cidade e para os RUCs”, afirma a pesquisadora.
A maior parte dos casos foi entre meninas e mulheres de 15 a 24 anos. Nos bebês, a sífilis pode provocar cegueira, surdez, deformação óssea e dos dentes e deficiência mental, embora estes não tenham sido foco da pesquisa, concluída em 2023.